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Taquaritinga

Sumário / Índice
Tenente Galinha - Caçador de Homens - Eu sou a lei
de OLIVEIRA FIGUEIREDO, Adherbal
Ano: 1965
Nº de Páginas: 231 pp.
Editora: Exposição do Livro
Numa época de grande bandidagem no interior, a “captura” ou a “volante” como era conhecida a escolta do famoso Tenente Galinha , da então Força Pública, era temida por todos, principalmente pelos que andavam fora-da-lei. A escolta era, geralmente, composta por dez soldados e mais o comandante. Faziam parte da escolta: Isidoro que era o ajudante de ordens; era o homem de confiança do Tenente Galinha; Serelepe, nego danado; Gambá, Cuiabano, Boca de Fogo. Em cada lugar que passava, Galinha recrutava dois ou três “pombeiros”, isto é, aqueles que conheciam o terreno e indicavam os lugares onde os bandidos se alojavam.A escolta do Tenente Galinha passou por Ribeirãozinho, tanto é que a primeira narrativa do livro se passa na então Ribeirãozinho. Em Taquaritinga,o autor de livro conversou com o antigo morador, Sr. Alfredo Prata, que conhecia todos os detalhes da caçada do Tenente Galinha aos criminosos, que tinha as alcunhas de “Vaca Brava” e “ Canguçu”, e que agiam naquela região. No livro, assim é reproduzdar essa passagem, que se encontra registrada às folhas 19 a 24 do livro de início citado:“. . . A poeira na estrada e o tropel de animais anunciavam à Vila de Ribeirãozinho a chegada da escolta do Tenente Galinha. Já no primeiro botequim correra a notícia:
-- “O Galinha está aí ! O Galinha !”
E todos naquele pequeno amontoado de casas, homens e mulheres, diziam isso com um misto de respeito e pânico. Galinha era para eles sinônimo de opressão, de horror; somente tinham um desejo: fugir, escapar para não levar uma formidável surra e serem obrigados a contar o que se passava na Vila. Tinham medo, porque quando fosse embora o Galinha, lá estariam bandoleiros famosos como o Vacabrava e o Canguçu.
Era a atmosfera do tempo. O banditismo ou a implacabilidade das capturas.
Eu sou a lei
O Tenente Galinha, sem descer do alazão, gritou ao primeiro homem que viu:
-- Você aí, “seu coisa”, onde fica a cadeia ? Diga logo se não quiser ir pra lá.
-- Fica logo ali, alferes, pertinho. O doutor está lá também – respondeu tremendo o pobre homem.
-- Que doutor, que nada. Onde estou mando eu e mais ninguém. Eu sou a lei, aqui e por onde passar – retrucou empinando o peito, o famoso caçador de homens. Esporeou o cavalo e gritou para a escolta: -- Vamos cambada.
Descia a noite sobre a pequena Vila, futura Taquaritinga, e o Galinha reuniu os homens, juntamente com os pombeiros escolhidos para o trabalho. Serelepe estava agitado, queria sangue. Isidoro aguardava as ordens do tenente. Cuiabano, Boca de Fogo, Gambá e outros terríveis auxiliares de João Galinha, esperavam, ansiosos, o momento de iniciar a caça aos bandidos.
A escolta foi dividida em dois grupos. Os pombeiros Zé Pintinho e Manoel do Saco, entraram imediatamente em ação. Aproximaram-se da casa onde o famoso Vacabrava repousava em companhia de sua amante.
Estava fria aquela madrugada de 15 de fevereiro de 1901. E foi tiritando que o Zé Pintinho voltou vitorioso:
-- Ta lá o homem, “seu” Tenente. Ta lá o bicho.
Galinha olhou para Serelepe e disse:
-- Como é, canaia, está em condição ? Engraxa essa carabina, que o couro do Jesuíno, diz que é duro. Vai de arrastão e arranca o bicho fora.
Serelepe agitou-se todo. Sonhou com seus crimes. Queria ver sangue na parede da casa nº 105 da rua 24 de Fevereiro, ali na esquina.
“Será que o Vacabrava tem o sangue bem vermelho”, pensou o ousado Serelepe. “Vamo vê”. E saiu rastejando, encostando-se nas paredes. Enquanto se aproximava, o Tenente deu suas ordens aos integrantes daquele grupo, ao mesmo tempo que instruía outros comandados, que, de posse das informações do pombeiro Manoel do Saco, iam até a tapera onde estava Antonio Canguçu.
O ataque
Serelepe chegou à porta. Forçou-a. Nada conseguiu. Nesse momento, sentiu que sua presença já fora notada. Parece que, do outro lado da grossa madeira, um coração pulsava violentamente. Serelepe pensou em sangue e não resistiu: meteu o pé na porta, afastando-se rápido. Jesuíno Vacabrava, um dos mais temíveis valentões da zona, apareceu na soleira. Num segundo, Serelepe ergueu a carabina e apontou.
“Não atire!” – gritou o bandoleiro, evidenciando o desejo de se entregar. Mas o grito foi abafado pelo disparo seco da arma do comandado do tenente. Este chegou em seguida, com os demais homens do grupo. Ria alto e dizia:
-- Levar preso um porco desse ! Fica caro o sustento de um canaia. Mate mesmo, nego atoa. Chumbo nesse bicho.
Enquanto dois soldados tratavam de carregar o corpo do Vacabrava, o Galinha esporeou o cavalo. Foi em direção à rua Barão do Triunfo, onde os soldados do segundo grupo faziam o cerco em torno da casa de Antonio Canguçu.
-- Aperta, macacada. Chama Isidoro. Está com medo, vagabundo ? É só tamanho, hein negrada ? Seus . . . e dizendo uma porção de nomes o tenente Galinha animava os seus homens. Era tudo como ele dizia:
“Disciplina é lá pr´a São Paulo. Com nós é na bruta. Negro precisa é de guasca. Eu e soldado é a mesma coisa aqui. Nada de bater calcanhar”.
Galinha não gostava do quartel. Indisciplinado, era mais feliz andando, em diligências, apesar de preocupado com a amiga. Mulher danada aquela. Mas era um caso sério. Não era direita. Assim que o Tenente virava os calcanhares, como diziam os soldados, repassava do coronel até o praça. Era triste a mulherzinha. E foi pensando na Benedita que o Galinha gritou:
-- Esse home está aí ou não ? Se está, então entra cambada. Tão com medo, seus bicho ? Vamo gente, trás o tal pra fora.
Isidoro era um fiel cumpridor das ordens do seu chefe. Arriscara a vida várias vezes, sempre obediente. Admirava o Tenente. Sabia que não era na realidade um valente. Entretanto, já estava habituado com ele. E por sua fidelidade absoluta fora escolhido ajudante de ordens. Era o homem de confiança do Tenente João Antonio de Oliveira.
Isidoro aproximou-se da porta. Gritou:
-- Vamo, Canguçu. Bota essa cara pra fora que a carabina está te esperando.
No interior do casebre, Canguçu estudava um meio de sair daquela difícil situação. Via pela fresta da janela o movimento dos soldados. Bem ali na sua frente estava o Galinha, dando as ordens aos gritos. Podia acertar um balaço no famoso caçador de homens. Mas, que lhe adiantaria ? Mataria apenas um. E, depois, seria fatalmente trucidado pelos demais. Voltava seu ódio contra o Manoel do Saco. Se escapasse com vida, aquele homenzinho havia de pagar.
-- “Pulo esta janela. Pego o canalha de surpresa. Faço a confusão e na primeira brecha me escapo”, pensou o terrível bandido. E preparou-se para executar o plano. Passou a mão no ferrolho. Sentiu, o coração pular. Como saltava ! Nunca sentira a vida tão forte como naquele instante. Era preciso escapar. Abriu a janela rapidamente, ergueu uma das pernas, o deu impulso e pulou.
-- “Fogo, cambada”, gritou o Galinha, atirando no Canguçu. O bandoleiro foi apanhado no ar. Seu corpo caiu crivado de balas. O sangue tingiu a relva. Antonio Canguçu, o famoso capanga, homem temido por todos, era defunto. Não muito distante, dois soldados carregavam o corpo de seu companheiro de banditismo, o não menos falado Vacabrava.
Dois corpos foram jogados na frente do Tenente. Este olhou durante alguns minutos e pensou em mandar arrancar a cabeça dos dois e enviá-las para São Paulo. Mas daria muito trabalho. As cabeças fariam um volume grande. Decidiu cortar somente as orelhas dos dois facínoras. Chamou o Serelepe e um “bate-pau” e ordenou:
-- Nego sem vergonha, corta as oreia desses dois danado. Corta direito que elas vão pr´a São Paulo.
Serelepe tirou uma pequena faca da cintura. Passou o dedo, sentiu os dentes no corte. Não estava boa.
-- Vai sem corte memo, Tenente ?
-- Com ou sem. Vamo logo. Serelepe baixou seu corpo miúdo. Ajoelhou-se no chão. Meteu a faca. Estava muito duro de cortar. O sangue ainda jorrou do cadáver, sujando a calça azul e confundindo-se com a lista vermelha do uniforme. Serelepe gozava. O Galinha ria.
-- Deste ta pronto. Agora é a veis do outro. Puxa esse corpo aí, cabra do inferno.
E o soldado, que, dentro de uma conformação física mesquinha escondia um gênio mau, iniciou a operação no Canguçu.
Terminada a lúgubre tarefa foram as orelhas colocadas dentro de um vidro. O Galinha ia levá-lo para São Paulo. Mais tarde, porém, em Jaboticabal, mandou jogar o vidro no jardim da futura Praça Centenário, na cidade de Jaboticabal.
No cemitério da Vila de Ribeirãozinho estão sepultados Canguçu e Vacabrava, respectivamente nas valas comuns números 543 e 544, sem orelhas.
Os tocadores de viola do tempo, imortalizaram o fato nos versos seguintes:
Na vida do Ribeirãozinho
Valentão não se acaba
Mataram Canguçu
Jesuíno Vacabrava.
Triste sina destes homens
Fizeram uma morte feia
Depois de mortos no chão
Ficaram sem as oreia.
Canguçu era valente
E costumava pulá
No saltá de uma janela
Queimaram ele no á.
Numa outra passagem do livro, cita outro antigo morador de Taquaritinga:
“ --- O sr. Domingos Morano residia em Itápolis, em 1901. Um dia ali chegou a escolta do Galinha. Morano era fotógrafo e estava em casa quando foi procurado pelo soldado Serelepe : --- O Galinha chamava-o à Delegacia. Era para uma fotografia: a escolta e um grupo de criminosos capturados na região. Essa chapa de vidro me foi dada (ao autor do livro) pelo sr. Nicolino Morano que, em 1949, residia em Taquaritinga.”
Nicolino Morano foi fotógrafo aqui em nossa cidade e o seu “studio” se localizava à rua Marechal Deodoro, entre os prédios da “Nossa Caixa” e da Papelaria e Redação do jornal “Cidade de Taquaritinga” , de propriedade de Hamilton Aielo.
Características de sua personalidade.
Tenente Galinha gostava da aventura, do perigo e acima de tudo, de exibir a sua “otoridade”. Gostava de ação, barulho, correrias. Galinha, para quem não o conhecia, era à primeira vista, pela sua fama, um tipo valente, corajoso. Mas, aquele ar de corajoso era pura fantasia. Não passava de um covarde. Era medroso e por isso tomava certas precauções : sempre escolhia dois ou três homens de confiança e os levava consigo. Como de costume, não dormia; vivia em pânico; ficava a noite inteira espreitando; a qualquer barulho suspeito, acordava os soldados. Deitava-se com uma carabina entre as pernas, embalada, pronto para qualquer surpresa.
A pergunta que se faz: era um homem corajoso ? até certo ponto; mostrava valentia quando estava protegido pela sua tropa. Tinha que mostrar pulso firme; tinha que manter a escolta unida, sob sua liderança. Se assim não acontecesse, qualquer fraqueza da parte do comandante, poderia provocar entre os seus subordinados uma ruptura de disciplina, fatal para os objetivos da escolta. Contudo, em mais de uma oportunidade, apanhado sozinho e de surpresa, dava clara demonstração de medo e se acovardava. Mas, quando estava com os seus subordinados, era corajoso, atuando como elemento de equipe.
Não era um bebedor inveterado; tomava suas cachacinhas, mas sem exageros. Nas horas de folga, distraia-se jogando baralho, mas não era bom no carteado, mas sempre vencia: ninguém queria ganhar do Tenente. Era um mau pagador e a todos faltava coragem para cobrá-lo.( sinopse adaptada do artigo "Tenente Galinha e a Captura", de Milve Peria, inserto in site Nossa Taquaritinga(2000).

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